É inevitável que o tempo continue
passando e mudando o mundo a nossa volta, certo? Mais ainda que as pessoas
tomem decisões diversas, que amizades sejam feitas ou desfeitas. E em “O
incolor Tsukuru Tazaki e seus anos de peregrinação”, de Murakami, esse passar
do tempo vem mostrar um grupo de amigo que, de um momento para outro,
simplesmente é desfeito, um dos membros é excluído aparentemente sem motivos e
fica a critério do leitor as razões, de fato, de isso ter acontecido. Ao
finalizar a leitura desta obra me lembrei de “O voo do gato”, de Abel Pietro,
em que também há um grupo de amigos e como a passagem do tempo afeta a eles e
as suas amizades. Contudo, a abordagem é muito diferente, mas permanece certa
melancolia desses anos e de como com o tempo relações antigas são mudadas.
Neste livro de Murakami, que é,
aliás, o terceiro que leio dele, o protagonista é um homem de trinta e seis
anos, um engenheiro que trabalha em construções de estações ferroviárias e que tem
um marco emocional em sua vida, algo que o mudou profundamente. Na época de
ensino médio, ele e mais quatro amigos formavam um grupo singular na cidade de
Nagoia, eles se entendiam e passavam boa parte do tempo juntos, um grupo que
tinha tudo para continuar melhores amigos por muito tempo. Quando terminaram o
ensino médio, apenas Tsukuru saiu da cidade de Nagoia, indo para Tóquio. Mesmo
assim, em todas as férias ele voltava para Nagoia para passar um tempo com os
amigos. Até que, nas férias do segundo ano da faculdade, Tsukuru Tazaki é
excluído categoricamente do grupo, aparentemente sem motivos. Convém dizer que,
exceto Tsukuru, os outros quatro tinham como apelido as cores de seus
sobrenomes – Azul, Vermelho, Branca e Preta –, o que fazia, desde então, que
Tsukuru se considerasse “incolor”. Ao ser excluído tão categoricamente, Tsukuru
se sente magoado e suas suposições de que ele seria apenas um empecilho aos
outros e de que nada tinha de especial pareciam se tornar realidade. O
protagonista passa então por um período obscuro em sua vida, quase meio ano
pensando apenas em morte. Em nenhum momento ele pensara em descobrir o porquê
fora excluído, mas nem por isso podemos culpá-lo; Tsukuru ficou tão magoado que
não conseguia pensar direito ou mesmo ter a coragem de perguntar o motivo.
"Dentro de mim deve haver algo fundamental que decepciona as pessoas. "Incolor Tsukuru Tazaki", ele disse em voz alta. No final das contas, eu provavelmente não tenho nada a oferecer aos outros. Não, se eu analisar bem, talvez não possua nada para oferecer a mim mesmo." (p. 115)
O protagonista então evita ao máximo
voltar a sua cidade natal. E isso só vem a mudar quando, já na casa dos trinta
anos, conhece Sara, uma mulher que fica curiosa por esse singular grupo que ele
teve no passado e no quanto isso afetou o seu emocional. Guiado por Sara, ele
decide enfim descobrir o motivo por trás de tudo, de desvendar esse mistério do
seu passado para poder encarar o seu presente e futuro, sem ter medo de ser
ferido pelo abandono novamente. É interessante ver a construção que Murakami
fez de Tsukuru, que, de certo modo, é bem-sucedido, trabalha no que gosta, mas
que tem essa marca do passado que não o abandonou mais. Durante boa parte da
obra vê-se certa melancolia, um desapego e uma sensação de dúvida que perpassa
os personagens.
"Você não acha um grande paradoxo? Ao longo da vida, descobrimos aos poucos o nosso verdadeiro eu. E, quanto mais descobrimos, mais nos perdemos" (p. 186).
O enredo é basicamente a vida de
Tsukuru após entrar na faculdade e passar por aquele momento obscuro a ponto de
desejar a própria morte. Sua mudança foi grande, e é um retrato de como emoções
fortes tendem a mudar as pessoas. Quando precisam encarar desafios maiores do
que até então já se depararam cada pessoa reage de um modo, e vemos isso não
apenas em Tsukuru, mas nos seus amigos também.
"- Mesmo que você tenha escondido bem a memória, mesmo que a tenha mergulhado em um lugar bem profundo, você não pode apagar a história que causou tudo isso" (p. 40).
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Imagem: arquivo pessoal. |
Ademais, a narrativa de Murakami
é simples, mas é muito bem escrita. Ao contrário de “Caçando Carneiros” ou “Após
o anoitecer”, o surreal não aparece tanto no decorrer do livro, mas não deixa
de impregnar a obra com certo teor “mágico”. Contudo, considerei esse um livro
mais pesado, com mais temas “proibidos para menores”. Mas tão interessante
quanto os outros que já li dele, e o recomendo para quem não se incomoda com
histórias que não são “bem fechadas”. E aí? Já leram ou se interessaram?
Já vi uns três livros desse(a) autor(a), mas nunca procurei saber mais sobre.
ResponderExcluirMas sei lá, acho que não é o tipo de livro que me prenderia.
Claro que não posso dizer nada com certeza, só deduzir como seria a leitura para mim através das suas impressões..
Beeijos
www.ooutroladodaraposa.com.br
Olá! =)
ExcluirCompreendo, mesmo que alguns livros mostrem ser interessantes também não me animo a ler. E se leitura não prende nem sempre vale a pena terminá-la.
Cada um tem seu gosto literário, afinal~ ^^
Este título, particularmente, acho que é melhor não ler se não a interessou. Não é um livro romântico ou com ação...
Talvez algo como "Após o anoitecer" lhe seja mais interessante. É um livro mais "levinho". =)
De todos os três livros que você leu do Murakami, esse foi o que mais me chamou a atenção, acho que fiquei curiosa por saber qual o motivo de o protagonista ter sido excluído do grupo de amigos.
ResponderExcluirÓtima resenha, Paula, parece ser um ótimo livro!
Bjs!
Hel - Leituras & Gatices
Olá! =)
ExcluirDe fato, esse é o mais curioso mesmo. Até porque, mesmo quando o motivo é exposto, ainda fica uma dúvida no ar~
Obrigada! ^^
É sim, um ótimo livro!
Estou lendo agora Minha Querida Sputinik do mesmo autor por indicação, (falaram tão bem dele que fiquei doida para ler). Estou no início da leitura, mas estou gostando bastante. Já leu?
ResponderExcluirLendo sua resenha me parece que ele é um autor que trata mais destas questões "reais", vidas comuns. É simples e interessante. Gostoso de ler. Esse parece ser um livro mais pesado, como você disse, mas não deixa de ser uma "vida comum", não sei se você me entende. Bons são autores que conseguem transformar isso numa grande, simples e tocante obra.
Esse livro eu já vi várias vezes, inclusive só fiquei sabendo do que se trata com sua resenha. Parece ser interessante sim. Gostei. Parabéns pela resenha!
Beijos e boas leituras,
Erica Regina.
parado-na-estante.blogspot.com.br
facebook.com/paradonaestante
Olá! =)
ExcluirAinda não li Minha Querida Sputnik, mas pretendo ler!
Entendi sim, é exatamente isso. =)
Embora há vários elementos comuns que percorrem grande maioria das obras dele (segundo comentários que li), toda obra dele tem algo da realidade, algo comum que é muito interessante, como disseste~ ^^
Esse é um dos motivos do porque gosto dos livros dele, é simples, mas tem essa parte de "vida comum", verossímil, além de ter certo surrealismo.
Obrigada!
Boas leituras para você também! ^^